COMO A BUG VAI USAR SUA FAZENDA DE INSETOS PARA PREPARAR RAÇÃO ANIMAL
A Bug Agentes Biológicos diversifica negócios com a entrada no setor de pet food ao desenvolver insumo para ração a partir de proteína de inseto, um novo filão no mercado mundial
Clayton Melo
O engenheiro agrônomo Paulo Bogorni, pós-doutor em entomologia pela Universidade de São Paulo, ficou impressionado com uma conversa que manteve certa vez com um de seus clientes, o também engenheiro agrônomo João Luiz Pisa. “Bogorni, tem um negócio aqui que, se a gente fizer, é coisa para Prêmio Nobel”, disse.
O tom foi meio brincalhão, mas tinha o objetivo de alertar Bogorni para aquilo que ele, Pisa, acreditava ser uma sacada capaz de se transformar num negócio inovador e com alto impacto econômico, social e ambiental: produzir ração animal, principalmente para o consumo de cães e gatos, a partir de proteína de insetos. Mais: a engorda das larvas seria feita com lixo orgânico, o que ajudaria a reduzir um dos grandes problemas mundiais.
Esse episódio foi há seis anos, quando Bogorni trabalhava como consultor independente e atendia a Pisa. Hoje, aquele bate-papo evoluiu para um negócio de fato que será lançado não mais como um projeto independente de Pisa com a consultoria de Bogorni, mas sim como uma nova startup da Bug Agentes Biológicos, empresa paulista eleita em 2012 a companhia mais inovadora do Brasil pela revista americana Fast Company.
A ração será desenvolvida com o uso da larva Hermetia illucens, conhecida mundialmente como Black Soldier Fly (BSF). A Bug vai preparar uma farinha a partir da larva, que será depois vendida para a indústria de ração preparar o produto final. O insumo deve estar disponível no mercado até o final desde ano, depois da obtenção das autorizações e registros legais necessários para a comercialização. “Acredito que tenhamos resolvido todas essas questões legais até outubro”, afirma Bogorni, que há quatro anos passou a ser gerente de novos negócios da Bug. “A expectativa é ter um volume considerável para venda até dezembro.”
A Bug se tornou sócia no negócio depois de Bogorni apresentar a ideia à empresa, em agosto do ano passado. O desenvolvimento do projeto até aqui consumiu investimento pessoal dos dois criadores de cerca de R$ 500 mil. O lançamento comercial deve receber uma aplicação de pelo menos R$ 10 milhões.
Diversificação
Com Pisa e Bogorni também como sócios, o negócio marcará a entrada da Bug em um novo mercado, o de nutrição animal. Fundada em 2001 numa incubadora da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), a empresa liderada pelos sócios Heraldo Negri, Diogo Carvalho e Alexandre de Sene Pinto é pioneira e uma principais referências no País na criação de insetos que combatem pragas de grandes culturas.
Além da ração para animais de estimação, carro-chefe da nova empresa, a proteína de insetos também será usada na produção de fertilizantes, outro mercado em que a Bug ainda não atua. “O novo negócio vai representar uma diversificação para a Bug”, afirma Bogorni, “Com a ração, continuamos focados em nosso know how, que é a produção de insetos”, diz. “Mas, dentro dessa filosofia, buscamos sempre soluções que tornem a vida no planeta menos agressiva.”
A referência se explica pelo fato de a ração ser feita a partir de insetos, um elemento natural e abundante, e também por contribuir com a questão ambiental, pois as larvas se alimentam de diversas fontes de resíduos orgânicos, como lixo doméstico e esterco. “Assim, transformamos um passivo ambiental em proteína e fertilizantes.”
O uso de insetos em ração representa uma nova fronteira no setor de pet food, que representou 67,3% dos R$ 18 bilhões de faturamento registrado pelo mercado pet no Brasil em 2015, segundo da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet).
A área em que já foi dada a largada no uso de larvas – embora ainda de modo incipiente – é na alimentação de gado e aves. A AgriProtein, da África do Sul, e a americana EnviroFlight, são duas startups que atuam nesses segmentos e têm atraído a atenção de investidores globais. No Brasil, uma das fabricantes é a Nutrinsecta, de Minas Gerais. A empresa produz rações compostas a partir de insetos inteiros, fragmentados ou moídos para a alimentação de roedores, répteis, mamíferos e aves.
Força nutritiva
Entre os benefícios do uso de moscas na nutrição está o alto valor proteico, mas não só. “Como se trata de um animal, há uma grande vantagem em relação às fontes de proteína vegetal, como a da soja, amplamente utilizada no mercado”, diz Bogorni. “Além de apresentar mais aminoácidos, o óleo extraído é rico em ômegas, inclusive o três, que é bom também para a alimentação de animais”. Em relação ao processo produtivo, o ganho é o prazo curto na preparação das larvas, pois a engorda pode ser feita em até sete dias.
Sem revelar estimativas de faturamento, a startup diz que a intenção é iniciar a operação comercial com a produção de uma tonelada por dia, expandindo-a num segundo momento para dez toneladas diárias. A projeção é que o empreendimento se torne o carro-chefe da empresa de agentes biológicos em até três anos. “O que nos despertou o interessou por trazer esse projeto para a Bug é o know-how para gerar escala”, afirma o entomologista empreendedor. “Aqui, temos o que é necessário para transformar essa iniciativa num grande projeto.”
A poderosa Black soldier
Conheça as principais características e aplicações da mosca que será utilizada pela Bug na produção de ração para animais de estimação.
- Seu nome científico é Hermetia illucens
- O óleo extraído da larva da mosca é rico em ômegas, entre eles o três, benéfico para a alimentação humana e animal
- Além de conter alto valor proteico, a larva possui todos os aminoácidos essenciais
- Uma de suas vantagens é o curto prazo para ser abatida no processo de produção: bastam sete dias
- Suas larvas já são utilizadas no exterior para produzir uma espécie de “refeição de insetos”, que serve de alimento para porcos, peixes e camarões
- Nos EUA, a empresa InviroFlight a utiliza para a produção de ração animal
- Reportagem publicada originalmente no número zero da revista Plant Project.
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