As razões para monitorar borboletas | Museu Paraense Emílio Goeldi
Pesquisador demonstra na Ilha do Combu como um sistema pode gerar informações estratégicas sobre a Área de Proteção Ambiental
Agência Museu Goeldi – A senhora Prazeres Quaresma dos Santos, ou dona “Neneca” como é conhecida por todos, lembra da infância na Ilha do Combu quando, em determinada época do ano, bandos de borboletas verde-amarelas revoavam sobre furos de rios e igarapés. Já faz algum tempo que essa cena ficou apenas na memória de quem viu: até onde dona Neneca sabe, a espécie de borboleta desapareceu da ilha. A causa do sumiço poderia ser desvendada por um sistema simples de monitoramento da biodiversidade. Esta é a proposta do curso oferecido pelo Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), na última sexta-feira, aos habitantes do Combu, ilha situada às margens do Rio Guamá, na região metropolitana de Belém.
No restaurante administrado por dona Neneca, que é uma liderança comunitária na ilha, reuniram alguns moradores da ilha, além de pesquisadores e bolsistas do Museu Goeldi e representantes do Instituto de Desenvolvimento Florestal do Pará (Ideflor).
Segundo a entomóloga Marlúcia Martins, promotora do curso e pesquisadora da Coordenação de Zoologia do Museu Goeldi, o objetivo do evento foi informar as razões e maneiras de fazer o monitoramento dos tipos de borboletas frugívoras do Combu - espécies que se alimentam de frutas fermentadas e carcaças de alguns animais.
Por que monitorar? - Monitorar, explicou o ecólogo e ministrante do curso Márcio Uehara-Prado, significa acompanhar um fenômeno ao longo do tempo. O monitoramento das borboletas é uma fonte de dados sobre o habitat do grupo, indicando também a qualidade ambiental e do estado de conservação do local. São informações relevantes para a Ilha do Combu que, desde 2007, é uma Área de Proteção Ambiental (APA) administrada pelo governo estadual.
Esse modelo de controle da biodiversidade foi sistematizado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão gestor de unidades de conservação no Brasil. A borboleta é uma das quatro espécies usadas atualmente para o monitoramento em nível nacional e tem apresentado bons resultados, devido ao rápido tempo de resposta que esses animais têm em relação às perturbações que ocorrem no meio ambiente.
Uehara-Prado lista outras vantagens na análise de borboletas. “Elas são animais diurnos, que permitem a aproximação humana e são fáceis de identificar e manusear”, disse. O método e os instrumentos de coleta também são bastante acessíveis e não demandam muito tempo e manutenção, podendo ser usados por muitos anos. Depois de uma introdução às características e hábitos das borboletas frugívoras, que são o foco do monitoramento, o grupo foi à prática em uma área de floresta na ilha.
Como monitorar – Uma porção de banana fermentada é o que atrai as borboletas até a estrutura de coleta. A isca fica no interior de uma tela cilíndrica, feita de um material parecido com os dos “mosquiteiros” da região, e posicionada a cerca de um metro do chão, dificultando a saída dos animais.
Entre 24h e 48h após a montagem da estrutura, o responsável pelo monitoramento checa o local e faz a identificação das possíveis borboletas capturadas. Para quem não é familiarizado com nomes científicos, muito menos com as categorias de famílias e subfamílias, o ICMBio agrupou as espécies por “tribos” e as organizou em um guia ilustrado e explicativo para os biomas da Mata Atlântica, Cerrado e Amazônia. Com a ajuda do material, qualquer pessoa é capaz de fazer o reconhecimento visual e a anotação das borboletas em uma das tribos da publicação.
Os participantes do curso de monitoramento no Combu receberam um guia de identificação referente à região amazônica com 13 tipos diferentes de tribo do inseto. Em uma das trilhas abertas para o ecoturismo nos fundos do restaurante de dona Neneca, o grupo montou as estruturas de coleta e horas depois simulou a captura e identificação das borboletas, orientados por Uehara-Prado. Os animais, como é padrão no módulo básico do treinamento, foram soltos ao final da dinâmica.
O desejo dos realizadores é fazer a capacitação completa dos comunitários. A ideia é que o trabalho de coleta realizado por eles, em parceria com pesquisadores e instituições científicas como o Museu Goeldi, resulte, em longo prazo, em um material de referência para mensurar a efetividade da gestão da APA do Combu e ajudar no seu aperfeiçoamento.
Dona Neneca aprovou o curso e manifestou o desejo de estender esse conhecimento a outros moradores da ilha, em especial os mais jovens. “Seria muito importante para que eles valorizem mais a riqueza natural daqui e ajudem na preservação”, afirmou.
Texto: João Cunha
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