Uma micro-reserva para proteger a borboleta azul que imita formigas.
08.01.2012
Helena Geraldes
A rara e ameaçada borboleta azul, que apenas sobrevive se for adoptada por formigas, ganhou esta semana uma micro-reserva na serra de Montemuro, no Norte do país, graças a um projecto da Quercus que teve o apoio da paróquia local.
A estratégia de sobrevivência da borboleta azul das turfeiras é, talvez, a mais surpreendente em todas as 135 espécies de borboletas diurnas conhecidas em Portugal.
Ao contrário do que acontece com as lagartas de outras espécies que, no Inverno, aguardam, escondidas na vegetação, pelo calor e Sol da Primavera para voar, a Phengaris alcon (anteriormente conhecida como Maculinea alcon) está debaixo da terra, dentro de um formigueiro. Aqui, a lagarta leva uma vida predatória, alimentando-se das larvas das formigas até estar pronta para surgir nos lameiros como uma das borboletas mais ameaçadas de Portugal. Actualmente apenas são conhecidas populações no Parque Natural do Alvão e na serra de Montemuro, esta última descoberta no Verão de 2011 pelo Tagis - Centro de Conservação das Borboletas de Portugal.
Na semana passada, a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza comprou 3500 metros quadrados no município de Castro Daire, na Serra de Montemuro, para criar uma micro-reserva e ajudar à sobrevivência dessa população de borboleta azul. “É um terreno privado, rodeado de baldios e pequenas propriedades, que comprámos com donativos de privados”, disse Paulo Lucas, do Grupo de Trabalho de conservação da natureza daquela organização.”Esta era uma ambição antiga nossa e quisemos perseguir o sonho de ter um espaço para esta borboleta”, acrescentou, em declarações ao PÚBLICO.
Para Patrícia Garcia Pereira, bióloga do Tagis, esta é uma “grande notícia”. “Foi por acaso, durante uma visita ao campo guiada pelo botânico da região Tiago Monteiro Henrique, em meados de Junho, que soubemos que havia naquela zona a planta onde a borboleta põe os ovos”, contou a investigadora. “Mas ainda não era a época de voo da borboleta. Bom, tenho de voltar, pensei. Poucas semanas depois fizemos uma nova visita e aí sim, encontrámos as borboletas, confirmámos aquela população”. Hoje é a população mais a Sul que se conhece desta espécie, em Portugal.
Naquela região, marcada pelo despovoamento, “as pessoas estão receptivas. Na verdade, a paróquia local ajudou-nos muito, por exemplo, a encontrar terrenos e a contactar os proprietários”, contou Paulo Lucas.
Gado, formigas e flores: a equação perfeita
No Verão, centenas de borboletas azuis esvoaçam nos lameiros de altitude. Mas há milhares de ovos que não sobrevivem, comidos por predadores como os gafanhotos. “A mortalidade é muito grande”, disse ao PÚBLICO Paula Seixas, que estuda a espécie desde 2003 no Departamento de Protecção de Plantas da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD).
Mas o ciclo de vida desta borboleta está ele mesmo cheio de desafios, conta a investigadora. É na primeira semana de Julho que se podem ver os primeiros adultos a voar, normalmente machos. “As fêmeas surgem três a quatro dias depois”. Quando chega a altura, acasalam e fazem as posturas nas flores de uma única espécie de planta, também ela rara, a Genciana-das-turfeiras (Gentiana pneumonanthe). Cada borboleta põe entre 40 a 50 ovos, que distribui por várias plantas. Um dos maiores problemas é a alteração deste habitat através do abandono do gado que mantém estas espécies de plantas, impedindo a vegetação de crescer demasiado. Um dos objectivos da micro-reserva é, segundo a Quercus, garantir que o gado continua a alimentar-se naquelas zonas.
Depois de passarem várias semanas na flor, as lagartas – na altura já medindo três milímetros - abrem um orifício e atiram-se para o solo onde são colhidas por uma única espécie de formigas, do género Myrmica, que as capturam pelas mandíbulas e as levam para o seu formigueiro. Estas confundem a lagarta por crias de formigas perdidas, por causa de uma substância hormonal, que imita os odores tão seus conhecidos. “Mas se não houver um formigueiro a uma distância de, pelo menos, dois metros da planta, as formigas não irão buscar as lagartas e estas acabam por morrer”, acrescentou Paula Seixas. Depois de terminarem o seu desenvolvimento larvar, as borboletas têm à sua espera, em média, dez dias de voo.
Tendência de aumento
Agora, o futuro da Phengaris alcon parece estar mais seguro. “No Parque Natural do Alvão, há densidades populacionais bem estimadas. Na maior população foram contadas entre 4000 e 5000 borboletas numa zona com 2,5 hectares”, disse Paula Seixas, da UTAD. Todos os Verões, Paula e a sua equipa saem para os lameiros para monitorizar e chegam a ter várias borboletas azuis pousadas sobre si. “De manhã à noite fazemos contagens, nomeadamente do números de ovos, a altura das plantas, que plantas preferem, etc. Queremos conhecer todo o ecossistema”.
“Nesta altura a população está a registar um aumento, especialmente por causa da gestão especial das turfeiras, nos lameiros, que se faz há alguns anos”, acrescentou. Ainda assim, o trabalho não tem sido fácil. “Tentamos sempre conversar com as populações, envolver as pessoas e falar-lhes da necessidade de promover a qualidade ecológica”, disse. “Em 2011 conseguimos a aceitação para usar a turfeira para o gado mas com diminuição do pisoteio em determinadas quinzenas cruciais para as borboletas. Aí não foi fácil e compreende-se bem a razão”.
Ao contrário do que acontece com as lagartas de outras espécies que, no Inverno, aguardam, escondidas na vegetação, pelo calor e Sol da Primavera para voar, a Phengaris alcon (anteriormente conhecida como Maculinea alcon) está debaixo da terra, dentro de um formigueiro. Aqui, a lagarta leva uma vida predatória, alimentando-se das larvas das formigas até estar pronta para surgir nos lameiros como uma das borboletas mais ameaçadas de Portugal. Actualmente apenas são conhecidas populações no Parque Natural do Alvão e na serra de Montemuro, esta última descoberta no Verão de 2011 pelo Tagis - Centro de Conservação das Borboletas de Portugal.
Na semana passada, a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza comprou 3500 metros quadrados no município de Castro Daire, na Serra de Montemuro, para criar uma micro-reserva e ajudar à sobrevivência dessa população de borboleta azul. “É um terreno privado, rodeado de baldios e pequenas propriedades, que comprámos com donativos de privados”, disse Paulo Lucas, do Grupo de Trabalho de conservação da natureza daquela organização.”Esta era uma ambição antiga nossa e quisemos perseguir o sonho de ter um espaço para esta borboleta”, acrescentou, em declarações ao PÚBLICO.
Para Patrícia Garcia Pereira, bióloga do Tagis, esta é uma “grande notícia”. “Foi por acaso, durante uma visita ao campo guiada pelo botânico da região Tiago Monteiro Henrique, em meados de Junho, que soubemos que havia naquela zona a planta onde a borboleta põe os ovos”, contou a investigadora. “Mas ainda não era a época de voo da borboleta. Bom, tenho de voltar, pensei. Poucas semanas depois fizemos uma nova visita e aí sim, encontrámos as borboletas, confirmámos aquela população”. Hoje é a população mais a Sul que se conhece desta espécie, em Portugal.
Naquela região, marcada pelo despovoamento, “as pessoas estão receptivas. Na verdade, a paróquia local ajudou-nos muito, por exemplo, a encontrar terrenos e a contactar os proprietários”, contou Paulo Lucas.
Gado, formigas e flores: a equação perfeita
No Verão, centenas de borboletas azuis esvoaçam nos lameiros de altitude. Mas há milhares de ovos que não sobrevivem, comidos por predadores como os gafanhotos. “A mortalidade é muito grande”, disse ao PÚBLICO Paula Seixas, que estuda a espécie desde 2003 no Departamento de Protecção de Plantas da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD).
Mas o ciclo de vida desta borboleta está ele mesmo cheio de desafios, conta a investigadora. É na primeira semana de Julho que se podem ver os primeiros adultos a voar, normalmente machos. “As fêmeas surgem três a quatro dias depois”. Quando chega a altura, acasalam e fazem as posturas nas flores de uma única espécie de planta, também ela rara, a Genciana-das-turfeiras (Gentiana pneumonanthe). Cada borboleta põe entre 40 a 50 ovos, que distribui por várias plantas. Um dos maiores problemas é a alteração deste habitat através do abandono do gado que mantém estas espécies de plantas, impedindo a vegetação de crescer demasiado. Um dos objectivos da micro-reserva é, segundo a Quercus, garantir que o gado continua a alimentar-se naquelas zonas.
Depois de passarem várias semanas na flor, as lagartas – na altura já medindo três milímetros - abrem um orifício e atiram-se para o solo onde são colhidas por uma única espécie de formigas, do género Myrmica, que as capturam pelas mandíbulas e as levam para o seu formigueiro. Estas confundem a lagarta por crias de formigas perdidas, por causa de uma substância hormonal, que imita os odores tão seus conhecidos. “Mas se não houver um formigueiro a uma distância de, pelo menos, dois metros da planta, as formigas não irão buscar as lagartas e estas acabam por morrer”, acrescentou Paula Seixas. Depois de terminarem o seu desenvolvimento larvar, as borboletas têm à sua espera, em média, dez dias de voo.
Tendência de aumento
Agora, o futuro da Phengaris alcon parece estar mais seguro. “No Parque Natural do Alvão, há densidades populacionais bem estimadas. Na maior população foram contadas entre 4000 e 5000 borboletas numa zona com 2,5 hectares”, disse Paula Seixas, da UTAD. Todos os Verões, Paula e a sua equipa saem para os lameiros para monitorizar e chegam a ter várias borboletas azuis pousadas sobre si. “De manhã à noite fazemos contagens, nomeadamente do números de ovos, a altura das plantas, que plantas preferem, etc. Queremos conhecer todo o ecossistema”.
“Nesta altura a população está a registar um aumento, especialmente por causa da gestão especial das turfeiras, nos lameiros, que se faz há alguns anos”, acrescentou. Ainda assim, o trabalho não tem sido fácil. “Tentamos sempre conversar com as populações, envolver as pessoas e falar-lhes da necessidade de promover a qualidade ecológica”, disse. “Em 2011 conseguimos a aceitação para usar a turfeira para o gado mas com diminuição do pisoteio em determinadas quinzenas cruciais para as borboletas. Aí não foi fácil e compreende-se bem a razão”.
Neste momento, um grupo de trabalho na Suécia está a fazer a composição genética das borboletas azuis das turfeiras. “Somos a zona periférica da distribuição da espécie, que também ocorre em outros países na Europa, e queremos saber se há diferença genética”. Além disso, a Câmara de Vila Real está a promover um projecto para reintroduzir a borboleta na Campeã, zona onde a espécie foi encontrada pela primeira vez, em 1949, e de onde já desapareceu. “Os campos foram transformados em milheiral, batatal e os cursos de água naturais já não existem. Mas agora estão novamente disponíveis” e poderão ser uma oportunidade para as borboletas azuis, trazendo de volta um campo rico em vida selvagem.
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